Caminho nas ruas vazias, escuras e molhadas pela humidade que arrepia num passeio. Olho para o céu, não está estrelado. Mas mesmo assim não deixa de ser belo, pois abre um buraco para a enorme lua, que nunca a tinha visto tão grande e amarela, espreitar e me ver por ali sozinha. É, na rua não há vivalma, e no entanto não me sinto só. Passo numa ponte, desco umas escadas e olho para a minha esquerda. O café está aberto e pelo que vejo atulhado de pessoas que bebem e se divertem até serem 5, para aí se dirigem à alma da noite: a discoteca mais próxima e a única. Aproximo-me entro e abro o casaco. Está calor lá dentro. Procuro uma cara amiga, mas em vão. É Inverno, a maioria dos meus amigos não vem para aqui nesta época, e se vêm não saiem de casa. Fecho o casaco e volto a sair. Está tanto frio que me arrepio e deito uma nuvem de fumo pela boca, ao respirar. Gosto destas noites geladas aqui, bastante mais que as noites de calor intenso. Subo uma rampa e olho à minha volta. A maioria das pessoas encolhem-se no bar existente ao fundo do pavimento, porém a esplanada está vazia, talvez por as cadeiras do sumol estarem molhadas. Entro no café mais célebre dali e peço umas batatas fritas, pode ser que me aqueçam. Agradeco à mulher preta do café de que tanto gosto por custumar atender-nos a mim e aos meus amigos sempre primeiro por sermos como ela nos chama "clientes habituais e bem dispostos". Torno a sair para o ar enregelado da rua e atravesso o pátio. Estou a comecar a sentir ansiedade, onde é que estão os poucos amigos que sei que vêm para aqui mesmo nestes dias frios? Olho para a gelataria agora fechada e penso nos bons gelados que se servem ali, no self-service, e de novo uma nova onda de arrepio passa pela medula por pensar em gelados naquela noite de humidade. Deixo umas escadas e passo por um átrio com contentores lembrando-me que em pequenina aquilo ainda nao existia e pensando para que é que servem se não para cheirar tão mal.. Subo uma rua olhando para a janela do ultimo andar de um prédio. Aquele prédio faz-me lembrar a minha Tia Lena, a minha avó Teresa e a Tia Tói e também a Mimi. Continuo. Em breve passo por um dos cafés mais antigos deste lugar. Antes de se tornar metade loja metade café, o café xico era uma casa de chá. Ainda me lembro das horriveis alcatifas cor de vinho, que sempre que se deixava cair um pacote de açúcar, tinha-se de ir buscar o aspirador para ficar impecável, e deixar fora de si uma séria de pessoas que tinham de aturar com o barulho. Lembro-me ainda das cadeiras que era lindissimas, brancas e antigas. Passo por ele lembrando uma série de acontecimentos ali, e em breve estou ao lado de uma das árvores da praca mais importante e suja deste lugar. Desisto. Está horrivelmente e degradavelmente vazia. Volto para casa e deito-me.
Agora é Verão e saio de casa, desta vez de top e calções e corro para ver se consigo arranjar uma aragem de qualquer maneira. No caminho para a praia encontro uma série de pessoas amigas e conhecidas que me fazem sorrir. Na praia então encontro milhares de amigos, tios e tudo o que possa ser uma cara amiga, entre eles o banheiro Sr. António, que já foi meu mister no futebol feminino quando estava neste lugar. Foi também ele que ensinou o meu pai a andar de bicicleta quando este era ainda um miúdo, e dou-lhe um aperto de mão e um abraço. Quem não vejo há muito tempo é a Bernardina, a moça dos bolos que conhecia bem o meu pai e nos dava bolos de graça. O meu pai disse-me ainda outro dia que ela partira, para sempre. Não deixei de ficar triste, e agora sinto a falta dela nesta praia já muito pequenina mas que em tempos foi enorme e ela era imponente ali com carradas de miúdos atrás dela a pedir bolos quentinhos pelo sol. Anoitece, e parto em busca de amigos. Em breve estou com eles, divirto-me e encarrego-me de me marcar para nas noites de inverno geladas me poder lembrar, passar por um sítio e poder sorrir com saudades de tudo e de todos enquanto o sol nunca tapado por nuvens iluminou.
É... sem dúvida alguma eu pertenco ali.
Ericeira...
6 comments:
Sabes, eu pouco fui à ericeira, por pouco tempo lá andei, embora aquele lugar seja realmente mágico. Mas, mesmo assim, enquanto ias passeando por essa vila pude identificar certos lugares, e percebendo que dela falavas... Gostava de ter algo assim, uma raiz, uma ligação, mas a única base que tenho é Lisboa, e lisboa não é terra de ninguém, é terra de sujidade e inamizade. Lisboa é apenas rasgada por um único treço azul que embora marcadao pelo homem e corroído por ele também, contínua a ser imponente e jovem, rodeando esta pequena e mundialmente insignificante cidade, que foi, em tempos, de madeira, frágil, sendo agora de pessoas, ainda mais vulnerável.
Mas, entretanto, mudei de assunto, e digo-te, já não conmsigo ver ericeira no mapa, ou noutro lado qualquer sem me lembrar insessantemente de ti.
Parece que a nossa Ericeira sofreu estas alterações irreversíveis à medida que, sem notarmos, íamos crescendo intimamente ligados a esta pacata vila. Curioso que o Ciclo que descreves (Inverno / Verão) mostra o verdadeiro apreço à ericeira de todos nós...ericeira não é só Verão, Praia, Saídas, Tios e Tias, é muito mais do que isso...Apesar de, no entanto, não ousar dizer o que possa ser para cada um de nós...
Quem não se lembra da Bernardina...Quem não adora o Sr. António...Quem é que na nossa idade tem paxorra para passar no Xico à noite?...
No entanto, parece que ainda ontem tudo era diferente...Mais calmo...Tudo era feito com menos ansiedade....Acordávamos mais cedo..Íamos de manhã bem cedo para a praia apanhar búzios..e por aí...
Agora apenas nos restam as lembranças do que era ser criança...do que era ser criança na ericeira..
Apenas ficam os verdadeiros amigos que começamos a colhes desde a mais tenra idade nesta vila comum a tantos de nós;)
e bonito ver que tens umm lugar como a ericeira, contigo e sempre.talvez um dia eu tambem o tenha...talvez londres?lol quem me dera...so tenhu lisboa por enquanto....muitos beijinhos gostei muito d todos os tens textos....muito verdadeiros e PROFUNDOS!very very good! ines meireles
os meus pais foram á erceira hoje. procurar casa para o verão. costumamos alugar sempre a mesma. mas esta ficou para a filha do senhorio. chegaram agora a lisboa. conseguiram alugar uma boa casa, na rua do xico, mais para baixo, por cima da antiga loja dos 300. na verdade, eu não me lembro de estar na ericeira noutra casa. vai fazer me confusão. mas parece que esta na rua do xico é menos pirosa. melhor. todos temos saudades dessa vila. mais do que as terras onde as pessoas costumam passar ferias, a ericeira é ericeira. mais que São martinho, baleal, figueira da foz, porto corvo.. o que fôr, ate algarve. ericeira é ericeira... e como ja disse, ir á ericeira é estar em casa, e querer lá ficar, todos nós que passamos lá meses de verão, alguns mais, levamos a ericeira no coração. é o nosso sitio.
A Ericeira vista pelos teus olhos,melhor,descrita pelas tuas palavras é claramente "O" lugar que qualquer pessoa gostava de chamar de seu.A não ser que encontra-se algo de muito semelhante sem "contentores do lixo que só servem para cheirar tão mal..."
essa tua discrição lembrame os invernos passados numa aldeia chamada Almoçageme onde cresci. devias me ter telefonado nesse momento vazio tao bom por momentos... para ir ter contigo e nao te deixar pali a sentires te rejeitada.bem mas nao vou comentar nada dos teus textos pois para mim um comentario e critica e criticar q por sua vez e dizer o q esta errado e para isso eu nao tenho nivel para te criticar. por isso vou e tar calado q ja dissse estupidezes a mais.bjs es espetacular.bjs nL
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