Vou tentar dedilhar a importância da observação; quando falo dela para mim. Disse-te que sou assim, tão neutra e expectante, tão de olhar e sorriso, mas não te disse o porquê. Na verdade sempre o fui, porque dos livros saio apenas para tentar ser menos pragmática, menos alusiva, mais realista. As coisas que descubro quando foco alguém em silêncio são ternas e aromatizadas de segredo e contudo de legitimidade. Alguém que se esconda do olhar, nem sempre consegue esconder-se do olhar do observador. Há atenção ao pormenor, há atenção aos defeitos mais belos. Mas contudo nem o observador consegue desenvacilhar uma mente turbulenta de uma serena, ainda que a conseguia sentir, cheirar. A irís torna-se capaz de abraçar os cinco sentidos, a pele torna-se mapa de tudo o que o rodeia, e daí o sorriso. Porque mais que olhar, o observador nato arrepia-se sem toque, só com olhar.
O observador inapto não consegue sentir. Detecta formas perdidas que os outros dissimulam ou perdem, mas não as consegue absorver. Entende-as porque as agarra, mas não sabe contudo prendê-las, aprendê-las. Aprisioná-las. E daí formula-se abominação, abandono, desconsolo do que é dos outros, mas pode ser dele no olhar.
Deter algo no olhar é para o observador abalado algo inconsequente, e por isso intragável. Mas eu reavivo-me com a loucura dos outros, os gestos cerrados, as palavras retidas que não são ditas mas das quais eu sinto o sabor. O silêncio resguardado, roubado do outro ao lado, e o prazer de estar ou o desconforto de querer fugir. A energia que flui do corpo na distância é tão bela e severa, tão triste e cristalina, que me faz forte, me faz sorrir. É só isso.
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