Wednesday, January 05, 2005

Não nego. Eu realmente, para além de escrever o que sinto de onde vêm aquelas palavras? Aquela inspiração? Dos sentimentos de outras pessoas claro. Ah! E da sua capacidade, que todos temos, de mostrá-los pela módica quantia de 15,50 euros. Mas pormenores à parte. Li num livro de Paulo Coelho sobre a capacidade de encontrarmos dentro de nós o eu triste, procurando a partir daí encontrarmo-nos com toda a nossa força e acharmos o Outro. Expulsar a pessoa triste, aquele meu eu, para um canto agreste e escuro. Encontrar o Outro dentro de nós é a maior descoberta que existe.
"Um sujeito encontra um velho amigo seu, o qual vive constantemente a tentar acertar a vida - sem resultado. "Vou ter que lhe dar algum dinheiro.", pensa. Acontece que, naquela noite, descobre que o seu amigo está rico e veio para pagar todas as dívidas que tinha contraído no decorrer dos anos.
Vão até um bar que custumavam frequentar juntos, e ele paga a bebida a todos. Quando lhe indagam a razão de tanto êxito, responde que até há dias atrás, estava a viver o Outro.
- O que é o Outro? - perguntaram todos.
- O Outro é aquele que me ensinaram a ser, mas que não sou eu. O Outro acredita que a obrigação do homem é passar a vida inteira a pensar como juntar dinheiro para não morrer de fome quando ficar velho. Tanto pensa, e tanto faz planos que só descobre que está vivo quando os seus dias na terra estão quase a acabar. Mas já é tarde de mais.
- E você quem é?
- Eu sou aquele que qualquer um de nós é, se ouvir o seu coração. Uma pessoa que se deslumbra diante do mistério da vida, que está aberta para os milagres, que sente com alegria e entusiasmo aquilo que faz. Só que o Outro, com medo de se decepcionar não me deixava agir.
- Mas existe sofrimento. - dizem as pessoas no bar.
- Existem derrotas. Mas ninguém escapa delas. Por isso é melhor perder alguns combates na luta pelos seus sonhos, que ser derrotado sem sequer saber porque está lutando.
- Só isso? - perguntam as pessoas no bar.
- Sim. Quando descobri isto, acordei decidido a ser o que realmente sempre desejei. O Outro ficou ali, no meu quarto, a olhar para mim, mas não o deixei mais entrar. Embora tenha procurado assustar-me algumas vezes, alertando-me para os riscos de não pensar no futuro.
A partir do momento em que expulsei o Outro da minha vida, a energia Divina operou os milagres."
Trata-se de segundas opurtunidades? Depende do ponto de vista. Isto porque se sempre, desde o início, tivemos presente o Outro então desde sempre conhecemos a vida assim, havendo assim mudança e não revolta por isso nos ser tirado - trata-se de uma decisão.
Por outro lado Deus dá-nos a oportunidade de vivermos a vida com mais beleza aos nossos olhos, de uma maneira que valha a pena - uma segunda vez na mesma vida.
Sim, de facto identifico-me enormemente com esta obra. Retiro o que tinha dito da mesma, desta vez li-o com sentimento autónomo, com o amor a leitura e os meus sentimentos à flor da pele. Aprendi que talvez tenha de te perder, para sentir que te tenho parte de mim, da minha vida. E aí chorarei lamentos por te querer de volta, mas o sentimento será outro, e não este que tanto detesto: a ingratidão da dúvida, a dor de não saber ao que pertenco, e aí talvez me encha de revolta pelo que sentirei, mas isso é só amanhã, não quero a Outra dentro de mim outra vez, nunca, nem mesmo nessa altura. Traz-me de volta o amor pela vida e juro que jamais te pedirei perdão outra vez.
Daqui parte a imaginação, e parte também o sentimento frio de como gostaria de me sentir agora, à semelhança de Pilar. Alegre, curiosa, feliz. Capaz de lutar pelo que queria. Amar um homem que me amava, sim amar da mesma forma que me amaria a mim. Era esta a mulher que eu gostaria de ser.
Senti uma dor forte e uma luz que me cegava e senti que, naquele momento a Outra deixava o meu corpo e o meu sangue e se refugiava num canto agreste e escuro. Imundo. E eu observo a mulher que até então fui. Desnorteada e perdida, fraca e de rosto absorvente de uma força que nunca possuí. Com medo de tudo, mas dizendo a si própria que não era medo - era sabedoria de quem conhece a realidade. Construindo muros nas janelas, para que a alegria da luz do sol não desbotasse os móveis.
Vi a Outra no canto. Desiludida, cansada e demasiado exposta ao perigo - vulnerável e frágil. Desafiando a rotina, escravizando um merecedor de liberdade: os sentimentos. Tentando julgar o amor futuro pelo sofrimento do passado, penosa por pecar e errar o mesmo amor incerto.
O amor pode tanto levar-no ao Inferno como ao Paraíso, mas leva-nos sempre a algum lugar. E aí é preciso aceitá-lo quando for, como for pois ele é o fruto da nossa existência, um rumo tomado sem amor não tem decerto um destino saudável e cheio de surpresas incalculáveis, não. Se nos recusamos morreremos de fome, enquanto vemos os ramos carregados de vida, sem coragem para estender a mão e colher os frutos sumarentos, amados por quem é guloso.
Ei de experimentar o que Pilar lhe disse para fazer, um milagre à sua maneira. Pediu-lhe que partisse um copo. Entendo porque não o fez logo. É o proibido, copos não se partem de propósito. Já lá vai muito tempo em que em pequenina, por querer mostrar que já sabia jantar sozinha, punha o copo na borda da mesa para ele me ser acessível, mas os nossos pais ensinaram-nos a ter cuidado com os copos. Mas também eles nos ensinam que paixões de infância são impossíveis, que as pessoas não fazem milagres e que ninguém parte em viagem sem saber para onde vai. Mas quando os partimos sem querer, vemos que não foi tão grave assim, num restaurante o empregado diz que "não tem importância", e tal como Pilar nunca na minha vida vi os copos partidos serem incluidos na conta. Se eu te pedisse para partires um copo não quereria que hesitasses. Para mim seria também um gesto simbólico. Parti coisas no meu coração mais importantes que um copo e estou feliz por isso. Parte um copo, e liberta-te desses complexos e conceitos, a mania que se tem de explicar tudo e só fazer aquilo que os outros acham correcto, apesar de saber que isso nem é importante para ti.
E tudo o que sobra no fim é o sofrimento por ti. Não digo que seja por tua culpa, mas ele chegou até mim. E como explicar um sofrimento por um homem? Acho que é impossível, Pilar também e Paulo Coelho também. Sentimo-nos no Inferno porque tudo é abolido, a nobreza e a grandeza não existem, apenas sobrevive a miséria. E então no cais da memória, no caos das saudades nasce um ditado que já há muito é conhecido por ser verdade - não existe amor sem dor - será mesmo verdade? Mesmo?
Tenho de me perder, pois quem ama tem de saber perder-se, precisa de saber encontrar-se. Pode ser que tu me ames realmente, não duvido, nunca duvidei, mas conseguiremos transformar este amor em algo diferente, mais profundo. Que estupidez, não existe nada mais profundo que o amor.
Nos contos as princesas beijam os sapos e eles transformam-se em príncipes, na vida real as princesas beijam os princípes e eles transformam-se em sapos.
Sim os sonhos dão trabalho.

3 comments:

s said...

"Por Favor, ver comments do post em baixo. Obrigado."

limonada said...

Tens 15 anos, não é isso?
Eu aos 14 descobri Paulo Coelho e uns tempos mais tarde, pelos 15 ou 16 anos descobri a realidade. Descobri que o que o Paulo Coelho escreve são um bando de fantasias românticas para mulheres de meia idade insatisfeitas. Ou para adolescentes perdidos de amor e confusos com as emoções... tudo isto disfarçado de literatura.
Cortei relações com ele desde então e não aconselho ninguém com menos de 20 anos a lê-lo. Mas isto sou eu, que sou bastante influenciável ;)

Experimenta o Domingo à Tarde, do Namora, as Noites Brancas, do Doistoievski.
São duas histórias de amor lindas. Verdadeiras e de qualidade.

Jair said...

Paulo coelho nao é propriamente o Senhor Professor Saraiva.
Quem o lé so acredita se estiver disposto a acreditar. Se eu quiser muito,muito,muito criar um Tyler Durten dentro do meu ser, eventualmente ele aparece.