Friday, May 06, 2005

Penso, ainda a tremer, de como as paredes outrora nuas do meu quarto hoje vao-se vestindo aos poucos de quadros, e cartolinas que só a Carlota tem em poder de fazer. As coisas não são acasos, não acontecem do nada. Também, se eu não tivesse saído da Ericeira, ainda lá estivesse a apodrecer, a troçer em mim um pouco da perspectiva filosofica de ser diferente. Porque é disto mesmo que se trata, o meu ser após a saida daquela casa fria, mas tão quente de memórias. Tornei-me numa pessoa má. Não má, no sentido de pecadora, não má no sentido egocentrico-egoista. Má no sentido que fui esquecendo tudo aquilo que fazia parte de mim, ali. É verdade, pronto, mudam-se os tempos mudam-se as vontades. Mudam-se as esperanças mudam-se as crenças. Talvez por isso, e não consigo explicar se se deu devido à minha mudança de vila-cidade, se se deu devido a factores históricos que não quero referir, cada dia que passa a definição de amor tem cada vez menos nexo para mim com o facto de me ter perdido em vissitudes da vida. Na sua cova. Imaginem assim de repente um peixe de agua doce a emergir de um rio de água salgada. Como era o seu estado? A abertura das suas guerlas?
Bem eu não me estou a comparar a um peixe de água doce, apenas comparo o meu coração. Não diga que tenha morrido, porque eu não penso com a mente, com o sentido das coisas, e se aqui escrevo palavras planas ou rectas tenho de ser, estar. Eu penso com o coração. Ora aí está um problema de compreensão. Não sei que pessoa seria se tivesse crescido aqui, nesta casa ou noutra. Como seria a planta dos meus pés, sem terem andados descalços pela pedra fria ou gasta pela areia. Como seria a planta da minha mão, sem ter tocado na cara do meu pai, sem ter tocado no mar por tantos anos. Como seria a planta do meu coração por não ter amado como amei, me dado como dei. Como seria o meu ser. Como seria a minha presença, aparição. Como me conhecia. Melhor, pior? Como era capaz de amar.

Marta, quando me lembro de Verão lembro-me instantaneamente das cerejas com gotas de água numa taça no banco da minha varanda, na Ericeira. Quando penso em Inverno, penso no aquecedor ainda antes de termos a lareira com a sua chama azul a ser projectada no nosso olhar, na Ericeira. Quando me lembro de Outono, lembro-me do perigoso inicio de aulas, da minha luta contra o assédio aos novos alunos da escola e das idas vertiginosas e sempre compassadas à loja do Senhor João, na Ericeira. Quando me lembro de Primavera lembro-me da plenitude da consciencia, dos olhares silenciados, das falas irónicas; das idas mais frequentes a Lisboa e dos passeios à beira mar, na Ericeira.

Ericeira a mais, mas nunca o suficiente, como sempre fora.

2 comments:

Mary said...

:)
Tou contigo em tdas M!
This is what dreams are made off!.. :D
AMO.TE ERICEIRA!

Anonymous said...

Tal como tu adoro a ERICEIRA! tá no coração, fantástica, não axas?